segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Destroços encalhados



Pedras, restos de tijolos, brita, barro, areia. Ferros retorcidos e enferrujados, sorrateiramente prontos pra ferir, quem sabe de morte, os pés dos que por lá se aventurem. Resultante da demolida sede administrativa do Alagoas Iate Clube, o “Alagoinhas”, uma montanha de entulhos permanece, impassível e inabalável, a compor a agora medonha paisagem daquela orla e a impedir a passagem dos que pela areia transitem.

Só em Maceió...

Há tempos aquele clube “dentro do mar” é alvo de discussão. Questiona-se, por exemplo, se é o responsável pela quase inexistência de areia naquela parte da praia que dele se avizinha. Para seus defensores, não fosse ele nem areia existiria mais (aliás, há cada vez menos areia, numa área cada vez maior da bacia da pajuçara). Fora lá irregularmente construído? Faltara autorização de quem de direito? Aqui também as opiniões divergem. E a polêmica se arrasta e, periodicamente, se exacerba.

Desconheço as nuances de ordem técnico-jurídica que embasaram a parcial demolição havida, tampouco sua discussão vem ao caso, aqui. Parece-me evidente, porém, que ali se construiu demais, o que me restou evidenciado pela sua sede administrativa, aquela que se pretendia à imagem da proa de um navio (exatamente a demolida). É verdade que o “Alagoinhas” já fora até cartão postal, mas, hoje, mesmo o que dele ainda está em pé são destroços encalhados a enfear quiçá o mais belo ponto turístico desta cidade.

Seja lá como for, o que não dá pra aceitar é que tudo fique como está. Demoliu-se-o, mas quem o fez sequer se dignou a retirar o lixo resultante. De onde havia uma proa de navio de cimento — de gosto duvidoso — surgiu uma grotesca montanha de cascalho e ferro a impedir, tal qual antes, mas agora injustificadamente, a passagem livre e segura do transeunte.

A verdade é que o jogo do empurra-empurra, de tão arraigado, parece já congênito desta terra. Ninguém quer limpar o monstrengo derrubado. Quem obrou — sem trocadilho, o entulho — crê que já fez o que lhe competia. E quem poderia limpar a obra, não o faz porque entende não lhe caber. Dane-mo-nos, pois!

Um alento, porém. Li, outro dia, na imprensa, que descobriu-se uma saída para o imbróglio: impingir-se a atribuição da limpeza ao... mar! Claro! É só ter paciência. As marés altas que virão farão o serviço. E o melhor: sozinhas e de graça! Puxa! Como não se imaginou isso, antes? Deixar-se, ao mar, a tarefa de levar a montanha para suas profundezas... Brilhante. Até poético! Hein?

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Escrito em abr.2006
Crônica publicada no jornal Gazeta de Alagoas, de 13/4/2006

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