segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Arrastão? Que arrastão?


http://www.humordaterra.com*

A mais recente novidade é a difusão de que não houve arrastão, ontem, domingo/18. Sim, tudo não teria passado de boato irresponsável e criminoso, realçado e nutrido pela sociedade maceioense. Maceió, portanto, não fosse pela sociedade — que deu voz ao boato de que o arrasto grande se fazia propagar —, permaneceria tranquila e segura como sempre tem estado nos últimos anos, a despeito das mentiras que propagam. Resumo da ópera: a sociedade é a culpada. Não houvesse a sociedade, seria perfeita. Mas como uma cidade sem sociedade? Eita!, é mesmo...

Por outro lado, lendo uma reportagem da Gazeta Web, verifiquei relatos de que teria, sim, havido o arrastão azul — uma amiga, no Facebook, assim batizara (não entendi...) aquele ato de vandalismo. Teriam atestado a existência do arrasto-grande-azulado um guarda municipal, um motorista de ônibus, um escrivão de polícia, uma doméstica e um gerente de loja (os nomes de cada um estão lá, no sítio referido).
Observei, também, inexistir notícia, na mesma notícia, de que sofressem de algum distúrbio mental ou emocional, ou mesmo fizessem parte desses irresponsáveis propagadores do nefasto boato — a despeito de integrantes da sociedade maceioense, o que já é um indício de que estejam mentindo.

Isto me faz recordar um dileto amigo, ex-empresário do ramo de panificação, então proprietário de um estabelecimento ali na Ponta Verde, pertinho da Praça Lyons. Na verdade, vejo agora, mais um boateiro neurótico e visionário. O sujeito teria desistido do comércio porque a sua padaria (o estabelecimento, por favor!) fora assaltada mais de vinte vezes. Sim, vinte vezes! Queixas à polícia, câmera e segurança na loja. Não adiantou. E não aguentou. Após o último assalto, ameaçado de morte com o cano de 38 na cabeça, fechou as portas. Observe-se, diria ele pra mim, que isto ocorrera na Ponta Verde, onde haveria policiamento. Imagina na periferia... Vai acreditar no cara? Claro que não, né? Mais um mentiroso.

Por outro lado, mesmo fosse verdade o que dizia o meu amigo, mesmo que esses assaltos e seqüestros que se sucedem no estado não fossem fantasia, mesmo que Maceió fosse, mesmo, a capital mais violenta do país (haja invenção!), uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa! Arrastão, não! Nem vem que não tem!

Hummm... Sabe o que é que eu acho, mesmo? Assim, sinceramente? A medrosa e irresponsável sociedade deu ressonância a esses fantasiosos e criminosos boatos só pra se vingar. Só pode ser. Chato, isso...
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(*) Não sou chegado a postar nada com palavrão (bobeira minha, certamente), mas essa do Humor da Terra tem tudo a ver.
Também publicado no jornal impresso Gazeta de Alagoas, pág. A-4, de 20/12/2011

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

A mala


http://bettomarx.blogspot.com

Estação Central de Milão. Aguardávamos o trem para Veneza. Precisava ir ao banheiro. Deixei Ana Paula e fui procurá-lo. Andei, andei,... e nada. Bexiga cheia, hora do embarque chegando, vi-me aperreado. Encontrei! Era pago. Tentei desesperadamente enfiar todas as moedas possíveis na máquina. Desisti.

Preocupada, sorriu aliviada ao me ver de volta. O trem chegara e não espera. Devo informar que em Maceió sugeriu-me comprar uma mala de quatro rodinhas, porque, argumentava, seu transporte é mais prático e, por isto mesmo, mais confortável: “bastavam dois dedinhos para empurrá-la”, dizia. Tsc-tsc. Que nada. Coisa de mulher...

Na verdade, logo que chegamos à Milão já senti uma ponta de arrependimento, vendo-a toda espigada empurrando sua mala com os dois pequenos e finos dedinhos.
Às vezes só com um. Tra-la-lá... (imaginava-a cantarolando em pensamento). Soubesse assobiar, estaria: fiu-fiu-fiu... De minha parte, peguei a alça da minha, deitei-a num ângulo de 45°, e fui puxando-a por uma das mãos. Percurso curto, não cheguei a invejá-la, ainda.

Agora, porém... Nem bem chegamos aos terminais, onde estacionada uma carrada de trens, vi-os multiplicarem-se a nossa frente enquanto, correndo, procurávamos o 9729. Ela empurrando a sua, que deslizava serelepe e suavemente pelo assoalho limpo e liso; eu, puxando a minha sobre as duas míseras rodinhas, naquele ângulo de 45º, com o braço já doendo pelo peso da bicha, além do cansaço pela corrida. Sem falar na mochila (eu) e na bolsa (ela) que carregávamos junto ao corpo.

Depois de muito correr — lugar grande do créu! —, localizamos o trem. Faltava achar nosso vagão. Corremos mais, aflitos com receio de que partisse. Instantes intermináveis em que sequer me lembrava da bexiga cheia, a grande culpada. Vagão após vagão... Nada. Rápida conferência do bilhete. N.º 006. Ainda era mais atrás. Corre! Às vezes virava-me para vê-la (eu era mais rápido e ia à frente). Lá vinha ela, empurrando-a com um mínimo esforço.

Encontramos, finalmente. Malas pra dentro, ofegantes e suados, livramo-nos dos grossos casacos, cachecóis e gorros que pretendiam nos proteger do frio europeu de abril. Sentamos. Ufa!

Pouco depois, no banheiro do trem, enquanto me aliviava do já enorme peso na bexiga, pensava: se arrependimento matasse, estaria morto! Outro engano. Não estaria, porque ainda iria me arrepender muito, durante a viagem que mal começara, por não ter comprado a bendita mala de quatro rodinhas.