terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Só um pedaço de papel no outono


Conto

Lá estava Maurício, de volta à vida de solteiro, naquela noite meio fria de uma sexta-feira de fim de outono de um ano quase distante qualquer, após longo período engaiolado. Trocava a roupa (trocava não, claro, porque vindo do banho devia estar sem roupa; logo, o correto é punha a roupa) para ir à sua primeira balada na nova condição. A maior dificuldade, de cara, seria arranjar um amigo, colega, ou conhecido mesmo (fazer o quê?), para servir-lhe de companhia, afinal, enferrujado como estava nas artes da conquista não seria uma boa alternativa a aventura iniciar-se solitariamente. Assim refletindo, e depois de puxar bastante pela memória, sem sucesso — já que os que se lembrara estavam casados ou namorando firme —, socorreu-se do novo recurso da consulta à agenda do celular (é que ele ainda é do tempo da agenda de papel). Já estava quase se dando por vencido, quando lá enxergou o nome de um sujeito com quem mantivera recente contato. Não era alguém com quem mantivesse alguma afinidade, mas era o que sobrara. Mãos à obra, então. Ainda teve sorte, pois encontrava-se em casa. Marcaram para daí a uma hora. Pontualmente, o cara apareceu. Eu ia dizer que ele foi pegá-lo, mas hoje pegar pode ser outra coisa.


Com ar de triunfo, — como quem anuncia uma grande nova e se dirige a alguém que não sabe mais o que é a noite, enquanto ele, o descoberto na agenda do celular, seria o descolado —, comunicou a Maurício que iria levá-lo a uma boate. Legal, pensou. Nunca mais pisara uma. E aquela não era uma qualquer. Era a da hora, a que estava bombando (mais uma gíria nova a somar-se às que vinha descobrindo). Vestia uma camisa de manga comprida, arregaçada (não era social, não, mas era de manga comprida). Jorge, por sua vez, com uma de malha, meio elástica, que se ajustava ao corpo e era curta nas mangas e no comprimento. Depois, bem depois ficou sabendo que se chamava “baby look”; até então pensava que “baby look” era só blusa, portanto só de mulher; homem vestia camisa, ora! Não, o companheiro eventual de balada não era viado, não! Ao menos não que soubesse, claro. É que era moda, como ainda hoje é. Deve ser pros marombados, que gostam de malhar ferro (tem gosto pra tudo), exibirem seus músculos. É, homem agora é exibido também. Até posa nu pra revista! E revista pra viado, imagina só! Quem diria um dia isso? Aliás, viado hoje não é mais viado. É gay. Mais uma bobagem. Deve ser por causa do tal do politicamente incorreto. Ora, cada um faz o que quer com..., deixa pra lá. Hoje em dia, até dizer que “tá preta a coisa” pode ser interpretado como preconceito. Ah, viado está com “i”, aqui, pra diferençar do veado, bicho que anda de quatro (sem trocadilho, por favor).

Estacionam o carro próximo. Chovia. Sempre chove em Maceió nessa época do ano. Prenúncio do inverno que está por vir, certamente. A noite fica meio triste. Mas não aquela, claro. Ele até pensou ter visto a lua!... Por isto mesmo cogitou de levar um guarda-chuva, mas desistiu: seria uma atestado de antiguidade. E quem seria antiquado de ir para a noite com um utensílio desse, hoje em dia? Oxe! O jeito foi correr. E tome chuva na carcaça. Por isto detestava aquela estação do ano, para quem nada mais era do que um inverno metido a bonzinho, porque teoricamente mais brando. Uma estação hipócrita, isto sim! Um inverno dissimulado.

Entraram. Escuridão do caramba! Difícil enxergar alguém, o que dizer-se de olhar nos olhos de alguma menina (menina é como ainda se referia a uma garota ou mulher bonita), a não ser que se ficasse a quinze centímetros do seu rosto. Tava ferrado, pensou. Então não iria poder dar uma paquerada antes da, digamos, abordagem que, sonhava, se seguiria? Despediu-se de Jorge — a essa altura rodeado de amigos dele, também de “baby look” e também marombados e falando abobrinhas (gritando, porque o som e o barulho de vozes era ensurdecedor) — e pôs-se à caça. Antes, o reconhecimento do terreno. Vou dar um giro (uma volta), pensou. Não demorou muito, identificou o “dancing”, embora havia gente dançando por quase toda a boate. Comprou uma cerveja, com bastante dificuldade — dado o número de pessoas que queriam o mesmo ou alguma outra bebida —, encostou-se no balcão e ficou a espiar, sondando o ambiente ao redor. Tomado o primeiro gole, a dura constatação: quente! Voltou ao vendedor. Reclamou. “Tá tudo assim”, disse-lhe. Pediu gelo. Sapecou umas duas pedras no copo descartável e voltou ao balcão. O fato, porém, é que apesar da companhia remediada, da impossibilidade de levar seu guarda-chuva, dos marombados, das abobrinhas, e até da cerveja quente, estava na boate! E estava satisfeito consigo mesmo.

O movimento de gente passando (se espremendo umas nas outras) era muito grande. As mulheres, normalmente em bandos, e os caras, idem. E ele sozinho a observar, tentando ao mesmo tempo, mas sem sucesso, paquerar alguém com seu velho método. Deparou-se, assim, com a primeira novidade: os rapazes, agora, abordavam as meninas pegando em sua mão ou no seu cabelo, quando estas passavam por perto. Já as garotas desfilavam mais das vezes perfiladas em trenzinhos, saltitando uma atrás da outra ao som da música. Em resposta ao talvez agressivo assédio, ora eles recebiam uma careta de desprezo, ora de raiva, ora um desaforo, ora nem um olhar, mas não raro também uma expressão de quem gostou da afoiteza masculina. Vezes ouve em que a pegada na mão era tão bem acolhida, tão bem recepcionada, que a mina se virava e recebia (ou tacava, ela mesma) um guloso beijo na boca do muito bem-vindo atrevido. A essa altura, ninguém sabia quem é que era atrevido, afinal. Enquanto isto — vale dizer, enquanto engalfinhavam-se e às suas línguas —, as outras aguardavam, excitadas. Depois, supostamente com a sua ainda íntegra e corretamente alojada em sua cavidade bucal, “libertava-se”, feliz, do feliz assédio, e voltava a tomar o seu lugar no trenzinho, lambendo dos beiços o resto da baba do moço. Maurício ficou meio tonto. Um misto de decepção e excitação. É que pensava (pensamento tipicamente masculino, sabe como é): e alguma pra namorar, como vou encontrar, como vai ser? Daí a parcial decepção, fazer o quê? Não vou mentir pra você, leitor. Mas também excitado ficou, afinal, concluiu, não estava ali pra arranjar namorada. Pelo menos não por um bom tempo. Ao contrário! Outra cerveja, então.

Ainda atordoado digerindo as novidades, percebeu uns caras dançando soltos. Qual não foi sua surpresa, entretanto, ao ver que não havia uma só mulher na “roda” que formaram. Dançavam aparentemente uns com os outros, feito as garotas da sua época faziam, isto é, entre si. Foi aí que constatou que o fenômeno não se limitou àquele “círculo”. Outros havia, maiores ou menores. Dançavam sós, isto é, com eles mesmos e sem mulher no meio, muito menos ao lado. Numa boa. Estava pasmo. Isto lhe seria impossível de imaginar. Troço desses acontecesse “no seu tempo” iria ser uma zoada danada... Como as coisas haviam mudado... Tô fora!, pensou.

Assim estava organizando as idéias, quando de repente uma bela mulher chamou-lhe a atenção. Conversava com uma ou duas amigas. Tentou encará-la, apesar da dificuldade já relatada, decorrente da luz escassa e das luzes psicodélicas frenéticas. Finalmente, entretanto, teve a impressão de ter sido notado. Continuou insistindo, enquanto percebia o ânimo voltando-lhe. É que, como já relatei, à excitação que sentia veio juntar-se, também, um tanto de decepção com a facilidade com que as pessoas se entregavam umas às outras, ainda que a entrega fosse apenas parcial. Por ora, pelo menos, via como parcial. Pois bem, ao olhar para a garota teve a nítida impressão de estar sendo correspondido, mas não ainda com a certeza que faltava para impulsioná-lo a abordá-la, ou, mais modernamente, chegar junto. O medo de levar um fora, amplificado pela falta de prática no ofício, em que se encontrava, fazia com que, cautelosamente, aguardasse mais um pouco. Enquanto isto, começava a sonhar, imaginando os melhores desenlaces para aquela paquera que se iniciara. Sim, agora constatava, ela o olhava também, repetidas vezes, embora furtivamente.

A bebida acabara. Foi comprar a última, para ajudá-lo a tomar coragem. Ainda socorreu-se do gelo no copo. Dois minutos depois, voltara. Procurou-a. Não a achou, entretanto. Droga!, pensou. Onde diabos se meteu? Maldita cerveja. Perder por causa dela — e que sequer gelada estava(!) —, a única mulher em que depositara alguma esperança de sucesso... Espere... Quem era aquela a beijar tão freneticamente, tão fogosamente o seu parceiro, que mais parecia uma só pessoa e não duas? Era-lhe tão familiar... Não, impossível! A garota estava ali, após apenas pouco mais de um minuto da hora em que saíra, abraçando-se e sendo abraçada gulosamente, sofregamente por outro. Ficou estatelado. A decepção foi total. Sentiu-se levemente deprimido, até. O sabor amargo da desilusão foi-lhe empurrado goela a dentro. Jogou a cerveja fora. Ficou ainda algum tempo a olhar a cena. Sentia-se quase traído. Aos poucos, porém, foi compreendendo melhor a situação, e até agradeceu aos céus por ter-se afastado aquela hora. Afinal, carente como estava, já se viu enamorando-se da garota, o que certamente lhe traria decepção ainda maior, depois. Ao menos parecia crer nessa suposição e nela confortava-se. Sua auto-estima, de qualquer modo, fora seriamente abalada. Convencido disto, dirigiu-se ao caixa. Nem se despediu de Jorge. Pegou um táxi, foi embora. Nunca mais voltaria ali, pensou com convicção...

Quinze dias se passaram. É, novamente, sexta-feira. Nosso amigo volta à mesma boate. Tomara umas duas latinhas de cerveja antes, no balcão de um bar próximo, pra esquentar. Veste uma camisa de malha, meio elástica, que ajusta-se um pouco a seu corpo (ainda) de poucos músculos (o pouco tempo de academia de ginástica não fora naturalmente suficiente a conferir-lhe a estampa que desejava). Sim, vestia uma “baby look”. De homem, fazia questão de ressaltar para si mesmo, enquanto conferia seu visual no espelho ao vesti-la para sair. Aliás, perguntou umas dez vezes à vendedora se aquilo era pra homem, mesmo. Comprou três.

Já entrou na boate meio dançando, cheio de ginga. Sentia-se o bam-bam-bam, o cão chupando manga, o “o” do bobó. Ao menos botou na cabeça que agiria assim, e assim estava atuando. Nada de sentimentalismos bobos, romances, muito menos baixa auto-estima. Se a coisa era “banda voou”, era no ritmo dessa banda que iria tocar. Pondo, literalmente, mãos à obra, não demora muito puxa o cabelo de uma gatíssima que passa perto, num trenzinho similar aos que vira naquela noite primeira. Repete esse gesto umas três vezes. Recebeu um “humpf!”, de um, um ar de desdém, de outra, mas já um risinho, de uma terceira. Segura a mão de uma quarta, que, afinal, corresponde. Rapidamente puxa-a pra dançar, solto mesmo. É que música pra dançar colado não existe mais. Arrisca beijá-la. É correspondido. Continua beijando. Pára. Continua dançando. Beija de novo. Falta-lhes o ar. Descolam as bocas. Repetem o gesto. Finalmente separam-se, como se aparentemente houvesse chegado o término combinado do entrelaçamento. Passam outras. Pega o braço, primeiro delicadamente, em seguida com firmeza. Ela olhou pra trás e sorriu, ao primeiro carinho. Beija-a, escandalosamente, ali mesmo. Separam-se e ela parte. Maurício vai ao banheiro, depois ao bar, onde pede uma cerveja para recuperar a saliva gasta nos beijos vitoriosos. Pensa: beleza..., se essa é a nova regra dos tempos modernos, tô dentro, já assimilei. Só não vou dançar com macho!

Acabou a cerveja e, daí a pouco, lá se foi pro “dancing”, agarrado a uma nova conquista e com a boca já melada de batom. Sentia-se todo-todo. Durante os refregas, os hormônios já não paravam de falar-lhe. Chamou-a pra sair da boate. Aceitou sem relutar. Chovia bastante, como de costume. Seu carro — agora estava de carro, claro —, estacionara longe. Foram correndo, debaixo de chuva mesmo. Sentia a roupa já molhada grudar em seu corpo. Na correria, ainda conseguiu olhar de lado, tentando apreciar como estaria a dela, sabido que era branca e de um tecido fino, levemente transparente quando seca, o que dizer-se assim, molhada... Olhou também pra sua face, que lhe pareceu ainda mais linda molhada e com os cabelos sensualmente desgrenhados. Dançaram, beijaram-se, abraçaram-se, saíram juntos da boate, mas ainda não sabia o seu nome.

Após algum tempo, em que desfrutaram da intimidade protegida pela chuva de outono incessante e pelo embaçamento do vidro do carro, deixou-a no endereço que lhe indicara, não sem antes pegar seu telefone, que ela mesma tomou a iniciativa de informar. Já em sua casa, deitado em sua cama e olhando para o teto, cansado da noite movimentada (e apertada), sentiu de repente uma rápida sensação de vazio. Lembrou de que nem havia perguntado seu nome. E vice-versa. Entretanto, apesar da estranha melancolia que teimava em perturbá-lo um pouco, satisfação era o que preponderantemente sentia. E com toda a disposição. Imaginava já como seria o dia seguinte, o sábado, e os que se seguiriam. Ah, a modernidade!... Seriam mesmo aquelas as novas regras do jogo do amor, da conquista? Fossem, aprendera direitinho. Parecia já estar em pleno verão, quando os hormônios jorram a todo vapor. Entretanto, ainda viria o inverno. E lá fora, numa poça d’água de chuva qualquer da rua em frente, jazia um pedaço de papel com um número de telefone.

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Também publicado no jornal Gazeta de Alagoas, Caderno Saber, de 03/01/2009, e no site BrasilWiki!
Foto: olhoabertoparana.blogspot.com

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Nada que cisque pra trás

Tava aqui na frente deste teclado amigo (bajulando..., pra ver se ele me ajuda com a inspiração que teima em bater-me a porta à cara), matutando como abordar o tema das mal-traçadas linhas a que me incumbi criar (ou seria alinhavar?) até amanhã, quando minha mãe vem me lembrar que hoje, véspera de ano-novo, não se come bicho que cisca pra trás. Na verdade, não sei se algum bicho cisca pra frente — donde haveria aí redundância imperdoável dela, e minha, que a absorvi —, mas vamos admitir que sim, tá? Se não por mim, ao menos pela minha mãe querida. Assim, na véspera e, claro, na ceia de ano-novo, nada de comer galinha, frango, pinto, peru e por aí vai (parece até que tô maliciando, ao citar essas últimas espécies, pinto e peru, mas tô não. Juro! Afinal, pinto, não, mas peru não se come na ceia do Natal, mesmo?). E parei no peru — olha ele aí, involuntariamente, de novo — porque não me lembro mais de nenhum bicho que cisque pra trás e a gente eventual ou cotidianamente trace. Se houver outros, considere-os igualmente proibidos; só isto.

A propósito, e ao contrário, esclareceu-me minha antenada mãe (algo me diz que ela não vai gostar muito de sua involuntária participação nesta crônica) que muito bom para a ceia de ano-novo é o porco, já que fuça a terra... pra frente! Percebeu? A lógica é a mesma. A diferença é que enquanto aqueles ciscam, e pra trás; este, o porco, fuça, e pra frente. Aliás, vai ter porco na ceia aqui de casa.

Pois bem, o alerta materno, que me propiciou os devaneios rasgados acima e, espero, adiante (quando mal ou bem concluirei a crônica, dando por encerrado o mister), se deu porque em meus planos primitivos — já, naturalmente, abortados — imaginava comer um peito de frango no almoço. Mas como disse: idéia sepultada. Segundo dona Ilka é porque levaria a gente pra trás — pro ano que finda — e não pra frente, pro novo ano, como deve ser. “Mas nem sem comer os pés do bicho?”, indaguei. Afinal, pretendia alimentar-me do seu peito, não dos seus pés. “Não adianta”, vaticinou, categórica. “Dá pra trás.” Humm... Seja lá como for, tem sentido. Afinal, quem cisca pra trás, olhe-se por onde se queira, é mesmo o dono dos pés. Estes o fazem porque são pelo proprietário, no caso o bicho, mandados. Aliás, galinha tem pés ou patas? Bom, custa nada adiar o peito do frango...

Eita! Lembrei-me agora, agorinha mesmo, do nosso amigo cachorro. Não, não é o apelido de alguém, não. Tô falando do cão! É, o cão, melhor amigo do homem! Oxe! Por que o espanto? E ele então não cisca (e pra trás) quando faz suas necessidades? Só que no caso do nosso velho companheiro, não tenho dúvidas, são as patas que ciscam. E será que os chineses e a velha guarda coreana o comem também na véspera de ano-novo? Bom, se comem, lá não deve valer a crença, já que esses países, ao menos economicamente, vão de vento em popa. Valha-me, Deus! Mais um motivo pra nunca incluirmos nosso companheiro no cardápio. Minha cadela, além dos cães do resto do mundo quase todo, agradecem.

Então peguei meus dois filhos que moram aqui em Maceió e fomos ao Xópin almoçar. Enquanto escolhíamos o que iríamos comer dentre as alternativas proteicas restantes (carne de boi, peixe, camarão, etecétera), não resisti em dar uma passada d’olhos nas mesas das outras pessoas que se serviam, acomodadas na “praça de alimentação”. Incrível! Juro! Não vi, nos pratos alheios imperdoavelmente, mas discretamente, investigados por mim, uma mísera asa de frango sequer, pra contar história. O que dizer-se de um belo peito do bicho, ou mesmo um empanado. Nada! Caramba! Então se trata de um verdadeiro dogma popular! Bom, ao menos hoje os frangos estariam a salvo, foi a conclusão inarredável. Que bom.

Findo já o almoço, toca o telefone celular. É minha preocupada mãe — preocupada com o meu futuro próximo (o ano-novo que se aproxima): “Oi, mãe. Diz aí.” “Filho, você já almoçou?” “Já, mãe”. “Comeu frango, não, né?” “Não, mãe. Comi, não”, disse-lhe, tranqüilizando-a.

Ah! Ia esquecendo de contar. Ato contínuo — isto é, imediatamente após receber o importante conselho e alerta materno —, tratei de providenciar fossem dele avisados, o quanto antes, meus filhos, demais familiares, amigos e, claro, vocês, meus queridos leitores e leitoras que, aliás, tiveram as impressionantes, quase inacreditáveis, generosidade e paciência de ler-me até aqui. Jamais seriam, até por isto, esquecidos, tanto que a crônica pretende cumprir essa missão.

Portanto, eis o aviso (e quem avisa amigo é): não comam bicho que cisca pra trás na véspera de ano-novo! Hein? Como assim? Não vão lê-la a tempo de eu conseguir evitar o desastre? Eita! É mesmo! E agora? Nossa Senhora! É verdade; quando esta crônica for publicada — isto é, quando vocês virem a conhecê-la — já estaremos no novo ano! Nada; preocupem-se, não. Vamos deixar de drama. Afinal, é só uma crendice popular. Confie em mim. Você que, desconhecendo o fato, comeu aquele peru na ceia de ano-novo, não vai andar pra trás, coisa nenhuma. Repita comigo: eu vou pra frente, eu vou pra frente, eu vou pra frente... Isto, continue dizendo umas cinquenta vezes por dia durante, digamos, o primeiro mês do ano. Pronto. Pode ficar tranquilo. Contra a força da crendice, a força do pensamento positivo. É infalível. Feliz Ano-Novo! Coitado...
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Também publicado no Boletim da Advocef (Revista da Assoc. Nac. dos Advogados da Caixa Econômica Federal)