quinta-feira, 29 de outubro de 2009

E se não houvesse a foto?

Crônica
Chamou-me a atenção a recente notícia de que um helicóptero do Governo do Estado teria caído. Não entendo nada de helicóptero — salvo que sou capaz de distinguir um de um avião, por exemplo —, menos ainda, naturalmente, de sua mecânica. Também não tenho a mais mínima intimidade com os procedimentos periciais que nessas máquinas se realizam em caso de acidentes, tampouco de até onde são possíveis de chegar, no que se refira à cabal descoberta de sua, ou suas, causas. Mas em tais circunstâncias os questionamentos surgem natural e imediatamente: A tripulação, e eventuais passageiros, estariam bem? Qual a causa, ou causas, do acidente? Falha mecânica? Erro humano? Bem, soube-se que não houve vítimas fatais, que o piloto fora hábil, de modo a felizmente conseguir desviar o helicóptero das áreas habitadas, e que eventual causa do acidente seria apurada. Ninguém estaria, pois, ainda, a culpar os tripulantes pelo acidente.

Mas dia seguinte os jornais noticiam, pasmem(!), que no tanque não havia combustível! Bem, se não havia combustível, a tripulação, de competente, hábil, começa agora a ter esses atributos questionados no íntimo do cidadão comum... Seria possível que a tripulação não houvesse percebido? Pior (mas nem sei se é pior, mesmo): teria notado, mas preferido arriscar? Aí fiquei me recordando (glup!) de algumas vezes em que já fiquei a pé por ter protelado a ida ao posto de combustível, a pretexto de não perder tempo, ou por preguiça mesmo... Tudo bem, tudo bem, que uma coisa é uma coisa, e outra... Mas... A suspeição já se instalara.

Eis, porém, que aparece uma pedra (ops! uma foto) no meio do caminho! Tirada do painel do helicóptero, pela tripulação, momentos antes do acidente, para posteriormente demonstrar aos seus colegas em terra a força dos ventos que estavam enfrentando. Na foto..., o marcador de combustível assinalando que ainda existia o precioso líquido para pelo menos mais meia-hora de vôo. Caramba, que sorte, imediatamente pensei! Bendita foto! Bendita providência! Divina, teria sido? Pra mim, sem dúvida. Mas não vem ao caso. O que me impressiona é que algo os moveu a bater a foto (para os incrédulos, mera coincidência), e esta poderá vir a ser a prova que baste a livrá-los da suspeita (no mínimo) a que houvessem sido irresponsáveis e, por isto mesmo, responsabilizados pelo acidente. Afinal, e se não houvesse a foto? A perícia descobriria que o marcador de combustível estava defeituoso?
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Foto: Gazeta Web
Também publicada no jornal Gazeta de Alagoas, desta data.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Aí você acorda...

Crônica
Aí você acorda e vê que precisa mudar. Não uma mudança qualquer. Algo que transforme sua vida. Que transforme seu ser. Altere convicções ultrapassadas, extirpe preconceitos. Torne passado o que já deveria sê-lo. Um novo presente está bem ali, um futuro diferente acena.

Aí você acorda e vê que precisa mudar. Dar lugar à generosidade, naquele espaço reservado ao egoísmo. Adornar sua natureza com a flexibilidade do eucalipto, e não com a rigidez do carvalho. Julgar menos, viver mais.

Aí você acorda e vê que precisa mudar. Enfim enxergar o que tanto relutou em ver. Deixar que a claridade entre pela janela de sua vida. Finalmente. A luz, onde havia névoas que você teimava em não deixá-las dissipar-se.

Aí você acorda e vê que precisa mudar. Aceitar as pessoas como elas são. Identificar suas próprias fragilidades e defeitos e tentar transformá-los em fortaleza e virtude. Cobrar menos. De si e dos outros. Viver mais. Viver melhor. Deixar que a vida o leve. Mas sem perder o controle do leme. Só não remar contra.

Aí você acorda e vê que precisa mudar. Ver que a luta nem sempre pode ser vencida. Antes é às vezes até pra ser perdida, porque pode não ser justa a sua vitória. Ou porque não haverá vitória. Nem derrota. Que a luta é inglória. Que você lutou em vão. Que sequer luta havia a ser lutada. Que a luta, você mesmo a criou.

Aí você acorda e vê que precisa mudar. Como você já acordou outras vezes, mas não mudou tanto quanto devia ou precisava mudar. Ou mudou o que pôde, o que conseguiu. Fez o seu melhor. Você finalmente vê que o tempo está passando. Que a vida passa, e não volta mais.

Aí você acorda e vê que precisa mudar. Aí você enxerga que precisa, realmente, acordar. Pra ver. E renascer. Ser melhor. Ser feliz. De novo.


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Também postada no sítio Talentos Prosa e Poesia
Foto "Amanhecer em Maceió", por Alvimar Rodrigues, em http://www.1000imagens.com/foto.asp?idautor=160&idfoto=44&t=&g=&p=95